quarta-feira, 14 de outubro de 2009

cinderela

vestido novo, golas e sapato. vai a praia sem carruagem e com os grandes olhos curiosos ocultos por lentes negras. o sapato insiste em não calçar no pé esquerdo. o príncipe não tem tempo. visita esta fábula apenas por ter na agenda uma anotação de dentes cerrados. e rangentes. fúria assassina de salto quebrando. na solidão de casa de botão não habitada. vai às compras. veste a máscara da mulher que não é. esconde os óculos de grau ainda mais no fundo da bolsa, de onde não saem a não ser para uma leitura noturna. "vita cartesii est simplicissima". o príncipe deve estar em paris lendo o new york times. ou, talvez, xangai com o último catálogo do british museum. ela nem tem seu telefone. com as sacolas pesando nas mãos. os livros pesam. e pensam. e pensa. ela sonha e desrealiza. põe os diamantes na orelha. amantes, quem precisa? ajusta a haste aerografada dos óculos com um movimento rápido, certeiro e elegante (reflexo de biblioteca) com o dedo indicador na asa que as prende rente ao nariz, equilibra o foco e atropela as referências.

.sem quebrar as unhas.

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