sexta-feira, 16 de outubro de 2009

a chuva doía gelada chicoteando a pele em faíscas quentes. no fundo negro dos olhos a cortina de águas. as poças convidavam, entre céu e inferno feitos de ondas frias, a jogar amarelinha. de um buraco a outro. um poço. eu posso? o sorriso largo rompia a escuridão como relâmpago. alma latejava e rumorejava. sempre se tem um quê de esperança. os mesmos castelos se iludem e se erguem e se evaporam e voltam. sem amanhã só importava a fúria da água e a placidez divina dos buracos que aceitavam os açoites. o céu é um buraco sem fim. o inferno é logo ali. o corpo se enchia. naufragava nos saltos. todo feito água. sereia serena cantando serenatas do sem fim. a dor forte feito fotografia velha espetada na parede do quarto. de tudo bebia os olhos. embebia a pele. não sabia dizer, na chuva, se chorava. quase não chorava. entre as ruas e quarteirões o vazio que sempre sentia se abria em largo infinito. esquina quebrada. ruas e árvores em que o medo, dependurado, silenciosamente espreitava. apenas vulto e luz em algumas janelas. os prédios se fazem torres neste xadrez. tão prontos a te devorar. os automóveis passam rápidos, sempre rápidos, afinal a vida é rápida. mas uma vida fracassada irrompia de nas ruínas afeitas como ruas. uma lua, duas até havia. enfim: num cruzamento [uma cruz é sempre salvação e perdição] o presente de uma natureza incógnita. ele, tímido, resistia, firme. um trevo de 4 folhas. a mão, sem pestanejar nos longos dedos de morte, o sequestrou. imaginou as estrelas para além das nuvens. deuses sem fronteiras. olhos de grande caos. agradeceu. precisava crer no para além de algumas nuvens, para além do puro vapor d'agua e da natureza da chuva. no bolso, o singelo presente quase que bucólico, não fosse o caso de não gostar de pastorelas. talvez fizesse sol amanhã. ou, talvez, chovesse.

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