quinta-feira, 26 de novembro de 2009
será agora
quando eu penso eu penso, e apenas penso, penso em ti. tranço as mãos nos teus cabelos querendo assim saber de teus segredos. há um resto de vento preso nos meus olhos forçando a fonte amarga que mancha o espelho d'água com cores de melancolia. retiro, uma a uma, as dores ocultas no fundo da gaveta, afrouxo o laço de cetim das cartas não-recebidas. o que falar para não perder este vislumbre tão desejado... eu te queria e isto apenas. provoco tantas cenas e subo três tons que me penduro nos acordes num desvio, ali onde falha a voz, justamente quando... eu queria poder dizer. não sei se gargalhas de mim quando apenas passa. eu posso cortar as recordações, me perdendo nas lembranças e ilusões. há um charuto, um vinho encorpado, um bilhete oculto no bolso do paletó. as minhas pérolas, acabo de as perder num lenço de seda. não acredito na eternidade, os séculos pesam na minha idade. aprisiono estes cisnes e os afogo entre papéis, cartas, postais, diários, tanto pedaço de mim, talvez mais importante que este velho e suado corpo que insiste em gritar tão somente quando o grito não sai. minha ópera é desenhada nos passos nômades de uma cigana dançando, e na dança, inebriada de mistério, luz e fogo, castanholas tirititantes, se descobre sozinha numa noite em que a lua foge ao cenário, sem magia, restanto desolada no meio de vultos bêbados, continua a dançar, como se este último gesto pudesse ainda salvar a música, impedir o silêncio, invocar uma nota a mais, uma nota a mais, e mais... o instante cai como chuva. um dia é preciso silenciar. por isso fecho os olhos para sonhar, ainda agora.
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