quarta-feira, 4 de novembro de 2009

a fuga da caixinha de música

j'oublié ma recherche.

sentada de pernas nuas ela observa. deseja desvendar o que se passa ali. no crânio do outro. a cabeça encovada dele se faz com cenáculo sagrado. cinematograficamente não diz. ela abre um botão do vestido nacarado. a pérola salta sobre o busto tímido. os cabelos curtos. os pés alvos. a mão na braguilha. os olhos disparam as setas. o corpo se faz todo em desejo. há um frio que sobe devagar a nuca e que como punhado de areia desliza sob as ondas de perfume deste corpo. sem nome. um assassinato. sem número. 37, diz a cinderela. tem jeito de querer um cigarro. bebe no puro cristal dos pés. o ventre palpita. o pezinho sangra em vermelho nada ponderado. extravagantemente real na cena em sépia. é preciso terminar o espetáculo diante desses olhos desejosos de meu fim. o perfil anguloso dele, à sombra oculta, finge que não observa. nem lamente. finge que não sabe que ela abrirá todos os botões do vestido e se descobrirá nua e sem amarras por debaixo dele. obviamente ela não fará isso. faz parte do sincero personagem que desempenha. deixe meu dinheiro aí, ao lado das flores que eu mesma comprei. o ventilador faz um barulho seco. sozinha. um jato frio no corpo. água com a temperatura cadáver do dia. encontro, enfim um cigarro. queria um charuto. gostarias, talvez? quebra uma unha por pura raiva, sem histerismos. sabe gostar dos tons de azul que despontam tão verdes dos braços. as poltronas vazias em torno. a passagem comprada. where will you go? de olhos fechados. to hell, of course. de olhos ainda fechados, nem sequer sonha, não se pode deixar cair neste luxo, em pé, fumando solenemente, nua, insiste em lembrar que os diamantes lhe machucaram as orelhas. o roxo de uma mordida anônima no seio esquerdo faz sinal. um suspiro fundo. o cigarro acaba. na última baforada como o real mais tangível desse 15º andar.

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