quinta-feira, 5 de novembro de 2009

o homem dos livros

há um retrato de freud ao revés do homem dos ratos. a biblioteca define. papéis amarelos. livros abertos na profusão de pensamentos que se entre-chocam. ele choca de leve uma idéia preciosa. capas de muitas peles. n'um canto um crânio ritual. n'outro a caneca de café e o cigarro. ritual. uma dor que cresce devagar. do edíficio antigo mergulhado estranhamente entre os prédios. ambos solidários. solitários. tão humanos e deslocados. não sabe se sente saudade. aqui está seguro. entre uma vênus de milo, máscaras incas, ídolos celtas, budas, tapeçarias persas. o mundo que cabe n'um cômodo. ali. submundo da cidade. 3 andares entre milhoes de andares. degraus para o inferno. um quadrado dentro de outro. malinovski. olha timidamente o stradivarius, queria tocá-lo. não deve. as grossas lentes, já não tão grossas. talvez derivadas de um novo polímero, não sabe, não s'importa realmente. funcionais. não vai ao museu das novidades. o amplo templo de corpos expostos ao sacríficio do tempo. de perfumarias apenas, de fato, os perfumes de sua requintada toilette. sem entrar no mérito da questão. um dia, meio sem querer, leva o dedo à boca, à saliva, vira a página. torna a repetir o movimento nunca antes feito. risco. arisco. arrisco. um gosto de estrela lhe atinge o paladar. sedução de um coração-corpo-mente assim esquecida. lentamente, como quem prepara um filho para a devora, rasga o canto de uma página e leva a boca. o canto das sereias. ulisses e o cometa. cometa o crime. come-esse-caminho. viciosamente começa a correr nos círculos secretos da biblioteca, como se tivesse muitas línguas e bocas, páginas são destrinchadas e cruamente engolidas. de gourmet á gourmand. a língua passeia como lesma pelo salão. viscosa a mucosa se abre em flor. até que... cólicas. obsesidade. ânsias e vômitos convertidos num mesmo caminho. fuga. que fazer? o medo se apodera daquele corpo-caractere. um corpo folhado no silêncio abismado do caixote século xvii entre os prédios tão modernos. and clean. em meio a dor só consegue um resmungo de pergunta, assim com os olhos ansiando por um apoio celeste na cúpula repleta de anjinhos: senhor, ajudai-me, não importa o que restará de mim, mas apenas o que sairá através de mim. o quê? céus...

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