sábado, 12 de março de 2011

quanto vale uma lembrança?

chove, como chovia quando sai. isto não quer dizer, mas chuva sempre torna as coisas mais poéticas. há este quê de melancolia que deixa as coisas meio em sépia. mas chove realmente e no real, no molhado das coisas, a chuva nem é tão bonita assim. meu corpo está úmido. meus olhos estão úmidos e o motivo não é a chuva. vi o fundo dos seus olhos, mas não toquei ali naquele lugar em que as retinas dizem que você é único. um mojito, por favor, já que não há gim ou uísque tônica. preciso conversar, por isso escrevo (algumas vezes) como quem conversa. eu tenho tantos livros, edições raras, autografados, edições de luxo.... aqueles com dedicatória simples de natal, de aniversário, que não simplesmente estão na prateleira. eu conto o tempo pelos livros, pelas páginas... sei dizer, por exemplo, que li foucault (quase todo) nas férias de verão de 2006, a microfísica do poder me lembra, assim, uma greve. domestiquei meu ''eye candy for the style hungry". é engraçado este assombramento criminoso: você esteve aqui, tenho as provas... eu estive, há os indícios... tudo organizado como traço de existência. eu tentei desenhar seu rosto, não uma ou duas vezes, há os esboços e as tentativas disto. a caixa das lembranças. eu guardo coisas demais, talvez como funes, chegue o dia em que não pense mais. apenas guarde e lembre... recorde-me... sem a melancolia imaginária destes dias de chuva. o teu acento com os assobios italianos, de ontem. na minha mente você estaria, no futuro, me esperando na saída da biblioteca. mas não vou mais as bibliotecas. é o sépia que se exige. o tom preto e branco das fotografias. nem toda lembrança é sépia. há a vermelha, carmim... do dente quebrado no ballet. sangue. tanto sangue. a cor rasgada do joelho machucado. as costuras da garganta no pós-operatório. as peças de algum brinquedo que ainda se pode encontrar em uma gaveta. sem tentativa de museus. sem salvar nada. apenas aqui, tentando sentir aquele rasgo de vida que foi. mantendo as palpitações. talvez eu exija demais. se eu tiver sorte... melhor parar o raciocínio aqui e dormir. nem posso dizer que é o alcóol. não lembro dele. bons sonhos.

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