[23h24 de 08/12/09]
[passando por Itajaí]
[passando por Itajaí]
I
a buzina forte, três bancos a frente, assim, na curva do olho, no efeito desejo,vislumbre de tecido lateral. a marca morena do abdômen quando levantou o braço. apolo não seria assim, não teria este samba assim. coisa que decerto tu nem ouves. um abraço forte e um gole de café faria bem. estando assim, bem louco pra beijar, mas o escuro, às costas a paisagem obliterada por um caminhão. o escuro assombra. é pesadelo no limite geográfico do abandono.
II
teu corpo se faz delicioso. se faço este poema é para te manter aqui, imagem latejante. a intermitência da distancia separa este corpo do teu. outro corpo negado. tua tatuagem te dá o espírito único nos teus olhos verdes vermelhos de sono. diz assim, devagar, tocando de leve os lábios no ouvido, que está louco, perturbado, seja como for, querendo ocupar este lugar de arrepios vago. a poltrona reclina, o gesto declina. diante de mim, se inclina e insinua isto, ambos sabemos impossível de palavra. não há destino imediato. não há final possível. Apenas o querer latente deste rosto indivisavel na penumbra.
III
as meias abafam os passos, um arrepio persegue as unhas, seguindo a curva num salto estrelado. dois goles d’água afogam o beijo que se quer. não há nada mais forte à mão, nenhum único desejo de retornar, assim nestes passos de bailarino bêbado, fazendo mágica erguendo a própria cartografia na página. esta página onde todos se empurram devagar, como se tivesse frente e verso, mas tudo, no branco vazio de barco, o afã baroc disléxico e que perde a luva nestas esquinas rápidas.
IV
a rodovia rodopia diante dos olhos fechados. os corpos-corpos cadáveres continuam inertes. as rodas fecham as portas do coração entupindo veias e fechadura com angústia e vazio de ecos. eu insisto em não saber cantar ou sorrir. tudo algumas vezes dá na mesma. ouço cássia eller cantando em francês. tenho tantas opções. nem sequer consegui tocar no meu chocolate suíço. as lembranças de um destino possível doem. eu não posso mais querer de. não posso mais tremer as palavras nos poemas que eu devo. devo mais poemas que dinheiro. eu faço versos como quem paga dívidas de vida, abrindo pulsos, sem ser dramático, contando uma história chaveada do amanhã.
V
as luzes da cidade acesas me ativam uma música que não quero trazer à cena. há no meu quadro de alice, dentro deste ônibus, um menino mau. que corre e grita. esperneia sem saber sonhar. sentado quieto, mantem a respiração irrequieta. devagar. o pulso domado sabe tantas verdades. já perdi, quase, este menino três vezes na curva da minha mão, com os dedos que insistem em apagar a linha. ele tem medo do pileque, do vômito, das máquinas enlouquecidas. gosta das garotinhas como outras garotinhas.
VI
abre o mundo sempre devagar. como pedir ao garoto, alice, um beijo, adivinha, para outro garoto. a dúvida persegue, a minha moça, nas ruas de londres, nas cartas de uma virginia. não me leve ao mundo. há um gosto de castanhola no sonho. um gosto de amor latino e ladino como os cães latindo que eu apenas vejo e não ouço. as violas, magias se fazem. meu deus. meu cadillac é isto aqui. me dá um ramalhete de flores murchas, uma luva e um anel de brilhantes. não, não é o que eu quero. o calor faz mal e pede sorte nesta noite sem estrelas e sedes candentes. a cadência desta vida é um trocado chacoalhando de leve na bolsa, uma moeda rolando pelo corredor, debaixo dos bancos.
VII
uma outra cidade. um outro quilômetro. o corpo inteiro te queria sem saber divisar teu rosto. eu tenho mil remédios, como os desejos, clássicos e las(en)cerados, o amargo na boca não é tristeza. é uma aspirina mastigada. que rola no digestivo abaixo. fazendo a mente manter sua garantia com algum. o sol poderá vir. mas não quero dis-curtir astrologia. Cansei de desejos. eu queria apenas que um soluço preso na garganta não se libertasse, que não houvesse necessidade do poema. o poema faz vezes desta banalidade, de ser pra você que me faz sorrir, mas eu só faço chorar. faço vezes de moderno, o tempo é rombo, não curva, as abóbodas são diante dos meus olhos ápodas não sabem como tomar o trem depois disso aqui. o ônibuso me leva. a alma fica presa em algum lugar. um cão mijando na esquina. engulo, duro, um sorriso. o teu. eu sei. eu deveria te seguir, mas tu não quis. tu não desenhou meu mapa. la nuit de mon amour, diz elis. mas sem ultimas estrelas desacredito essa pele infante, sem cor, sem sabor ao espelho. eu vejo as sombras que se lançam e se laçam numa felicidade ignorante de si. eu tomo goles rasantes de água, rente ao asfalto quente. é isso. a cabeça diante da guilhotina do desejo impossível aceita o vazio de si, desenha a curva, euclidiana, do seu ultimo movimento. ronde dans La terre. ronde en l’air. A ronda que a roda não sabe. meu último passo de ballet. pointé. point.
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