segunda-feira, 3 de maio de 2010

O retrato quebrado

Cansei de escrever para o vazio de um nome que no fundo não existe, senão como desenho em minha parede. Como aquarela que aos poucos abandono ao bolor. Minha fronte dói. Como abandonar uma possibilidade desenhada apenas como impossível, no fundo de uma neurose. Os personagens desenhados ocupam meu salão imaginário. Foram presentes. Literalmente, presentes, ainda que fora do tempo. Fizeram meu tempo, como você também fez, meio Quixote, meio agora e já. Talvez seja necessário vencer a imagem, lavar a memória, esperar no vazio de um borrão que a doença passe, não fazer imitação da vida. Prescindo do exercício, corro estes riscos, para não ensaiar tão somente meus jetés e pliés. Não tenho escolha, tenho? Parei de escrever meus diários há algum tempo, têm algo que dói nos últimos dias e não identifico. Não quero sobreviver a lei deste deserto. A fumaça alucinógena ainda preenche as entre-linhas. Não quero mais beber vinho, sozinho, abandonado no fundo desta cama, desenhando futuros impossíveis. As bolhas do champanhe não aumentam o espaço de minha bolha, meu chá inglês não traz notas aristocráticas. O que tenho nas minhas mãos? Enchendo de areia as palavras e minha mente. Ao vento tudo muda de lugar, pressinto que vou perder o controle. Preciso me abaixar e fundar o crime paranóico. Partilhando um primeiro-último banquete com a imagem desejada, antes do assassinato.

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