segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

talvez brasília

"Brasília já teve / de mim/ o pedaço que queria"
(Nicolas Behr)

a rua é larga, mas a cidade não chega nunca. a rua nem pode ser chamada de rua. ali, a cidade, suspensa na linha do horizonte. sou eu quem se confunde e espera notícias que nunca chegam. quem chega? alguém da minha ilha para conversas e sonos conjuntos numa cama compartilhada. eu machuco mais que os pés nas sapatilhas novas. estou no cruzamento de uma dúvida. sempre procuro os livros para o conforto, na tua ausênsia, insisto ainda na biblioteca: 9 horas da manhã. é daqui que escrevo. o ar é seco, quebra a pele, as certezas e os espelhos. sem guias de segurança na deriva. há o sangue que o ar força para fora do corpo e que escapa pelo nariz. corto, queimo, costuro. arranco a pele dos pés, mas devia me acostumar: eu sempre perco.
eu sempre soube da minha posição em meio ao double-bind e das escolhas impossíveis. eu nunca serei uma escolha.
o que vejo nos cacos, é uma não-mais-criança com algum dinheiro, sempre a acabar, andando pelas super quadras sem o rosto refletido, apenas nome e forma se fazendo no concreto armado das ausências (premeditadas) do não, do não ainda, do não mais...
quanto custa um táxi para minha casa? aqui é apenas o céu que me cativa. não o mar que não me cerca. a frustração do que nem quis se realizar dói no vazio do acontecimento. há o chacal que tem a silhueta recortada como o sonho de um prédio. ele vigia, selvagem, meus passos soltos, nas linhas de algum arquiteto que já não suporto e que me expulsa daqui. não vigie minhas letras... eu sempre erro pelo excesso. sempre insisto demais nas coisas.
é preciso pagar o preço.
alguém sempre dorme, há os que roncam,os que gemem... e eu: o décimo segundo corpo no lugar aberto que o coloquei. é esta terra ocre... vermelho sangue, tão insuportavelmente que afeta minha lógica de borracha com sua aridez. eu devia te escrever. quem sabe distante você me soubesse, menino-jaguar, como uma profecia em italiano no café que você bebe. mas eu só penso os meus mais funestos pensamentos em francês, para amenizar as pontadas.
é o plano piloto: eu que penso em partir, sem conexões...
a vida ainda faz cubo mágico: mil pessoas, talvez mais na contingência, encontradas como numa tempestade.
me sentir só nunca foi o problema. o que rasga a pele e arranha, animal selvagem, é o silêncio. os dias se resumem ao fato do parar de chover. não a chuva de verão desta cidade que cai todas as tardes, mas esta chuva-criança-na-cadeira-de-balanço-da-vovó. talvez seja saudade do não-sentido, do não-visto, do não-tocado. puro sonho?
sei que deve sempre chover, mais lá fora do que dentro de mim....
eu preciso dormir sem as luzes e parar com as pretensas iluminações. eu peço licença para crer que talvez o mesmo sol que me acorda todas as manhãs, queimando e marcando com fogo minha pele, te toca lembrando o desejo (posto em dois) de algum pôr-do-sol.

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