domingo, 22 de agosto de 2010

Algumas palavras para acabar com a magia

(enquanto o sociólogo, o psicólogo, o analista e o antropólogo dormem)

é quase como se a cabeça, lado esquerdo, tivesse se partido. talvez algum cavaleiro medieval não fizesse melhor que isto. não posso dizer que não tenho aqueles sonhos solitários. tu me contas do teu dia, enquanto lê teu jornal, não consigo ler as datas. talvez as datas nunca importem num tempo suspenso, sem corpos e sem referências. a biblioteca tem as peles mais extensas que se tocam. um café repleto de crimes, a rua desenha as faces do mal. toca minha testa, não há mais febre, só a dor pugente. o que se cai das mãos é um corpo desfacelado. tu és ainda uma criança indefesa, num parque enorme. e quê sou eu? tudo isto deverá ser arranjado numa precisão fulminante. teremos nós dois a mesma lembrança das fotos que olhamos. talvez eu fique nu em sonho e vá para a escola num dia de prova. tão comum este sonho. eu talvez quisesse o mínimo de um abraço. tenho sede. não tenho fillhos, talvez nunca os tenha. eu sei dançar e talvez o faça demais. shame on me. não me entende? não queria me sentir descartável, minha criança. eu sempre escrevo tua carta, você não é capaz de juntar os pedaços esparsos para remontar isto. eu, talvez, pudesse insistir em te perguntar: Est-ce qu'il collectionne lespapillons?, não sei se você saberia do quê falo. há um crime macabro em fazer das palavras este jogo de ossos. Eu te leria esta pequena historieta, mas não para dormir, mas para entender que se alguém ama uma flor da qual só existe um exemplar entre millhares e milhares de estrelas, eles só será feliz quando e enquanto a admira. talvez seja um excesso, talvez... mas falta o quente do teu corpo aqui. a tua respiração dormindo. as palavras talvez insistam em ocupar este lugar no lado literal da cama, mas o copo cheio se esvazia, torna a encher e esvaziar. mas sem magia. as flores murcham, o vazio é aquilo que lateja, a dor é aquilo que sem preencher espaço se faz presente.

Um comentário:

  1. Ev... que conto lindo! Essa imagem é perfeita "
    o vazio é aquilo que lateja, a dor é aquilo que sem preencher espaço, se faz presente."
    Parabéns pelo blog, cada dia mais lindo.

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