quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Do que não se vê

Rostro absoluto, firmeza mentida del espejo.
El espejo se olvida, del sonido y la noche
y se puerta al cambiante pontífice entreabre.
Máscara y río, grifo de los sueños.
(Lezama Lima, Muerte de Narciso)


O corpo molhado, o espelho capturando o corpo que se observa e lembra dos primeiros passos. Première position. Plié. O peso das mãos, com as linhas pesadas de um destino que não se deixa ler, obriga a cair esta fadiga. Uma mariposa voa a um canto, dando a cena congelada o movimento impossível de queda. É uma opera que talvez se arme no fundo real do espelho. Noites mortas em que as bordas secretas para além do suco de laranja e das torradas, além do acumulo e das falhas que o músculo absorve. Há na sombra uma estátua de um bailarino que se apaga. Sem música. Sem cor. Cabelos molhados, o rosto esperando o vento de uma moto de James Dean, mas isto é cinema, não é real, nem é desejo. É apenas uma boa imagem. De minha janela, aos pés da cama, entrevejo o mar, no azul profundo de tanta história, de tanta estrela não refletida sob o fundo opaco. Caí então o corpo como máscara. A única possível no encontro de si. É o sangue que corre que dá cor ao espetáculo armado de ossos e disto, impossível dizer. Sem super seres poderosos. É uma tentativa também de entrada neste país, nas vias do sonho, sem controle. Ali onde o mesmo gesto reiterado é potente e prolifera como num caleidoscópio sem imagem. O que indica aquela moldura? Não sei o porquê me visto também de noite.

Nenhum comentário:

Postar um comentário