(ao som de Pierro Lunaire)
eu não sei mais sofrer. por isso, sem falar quase mais nada, depois de 24 horas inúteis e outras tantas páginas mais, deito-me. respiro. nada dói, além do normal. as coisas se repetem. os finais de semana são diferentes apenas da semana e iguais a si. o que se repete numa segunda-feira poderá acontecer novamente numa quarta, mas nunca (creio) num domingo. deveria ter enviado um e-mail, começado um retrado, mas não. agora, quase onze horas, apenas deito. (não tive um sonho). não tenho como te contactar. precisava apenas de um abraço, sem querer perguntar quem cuidará de mim. marquei um bar, talvez, talvez ainda tivesse que querer um café, amanhã, diz a agenda, mas não, sei que não tomarei. queria poder levar minha xícara de chá tão real, tão royal, tão nobre. impossivel dizer "real" sem invadir uma realidade. talvez apenas os reis em seu sangue royal, azul royal-real, possam sobreviver a isto que paira além dos olhos, aquém da pele. não sou real. nem sequer rei. já não sei sofrer mais, o fundo do poço é tão raso. 30 cm de água, sem chuvas, sem lágrimas, sem vômitos. talvez devesse escrever d'isto numa outra língua, mais expressivo, mais mágico, mas não, resta e resto assim. meias, pijamas, cobertas, escuro. as polifonias que martelam enxaquecas dirão que amanhã vomitaram meu nome. eu sei. duas senhoras inglesas fingem, diante da minha janela, ler seu jornal, às 23h30 da noite? impossível. certamente espiãs. iniciais: direita e esquerda, a dupla, em inglês. certamente. esqueci minhas luvas. não sei sofrer mais. vou perdendo o fôlego, tentando dormir e dominar isto, o espaço, a coisa diante de mim. quem atirar ainda ao fogo? como esperar uma resposta impossível? necromantes me dizem do sexo e da morte. me lembro do sono, da febre, do sexo e da quase morte. nada mais. quem lerá o impossível nas rugas que o futuro anuncia no meu rosto, como marcas mendelianas. o livro herdado que o espelho desvenda. eu não sei sofrer, talvez soubesse algum dia, talvez adiantasse algum dia fingir sofrer. apertando ursos de pelúcia, passando frio, chorando e escrevendo poemetos ruins como definição de crença num amanhã. só talvez, mas não. amanhã virá igual a hoje e isto não é ruim. virá, animal que sou, sigo. amanhã: mais cinquenta páginas. braçal. enlouquecidamente, como apertar parafusos. há quem goste romanticamente de parafusos, sabia? eu não sei mais. o seu palco distante. o seu mercado distante. o seu escritório distante. seus livros aqui. os seus abertos tão inexistentes e insistentes. eu não. como derrubar-me. há que se acordar cedo e per-correr nos corredores das bibliotecas o últimos desesperos: não.
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