domingo, 9 de junho de 2013

o caso não era de que narciso fosse realmente belo, ele o era. mas não o era tão amante de si mesmo. não foi por si que se lançou ao lago, mas pelo estranho reflexo que ali encontrou. é que o lago, estando apaixonado pelo rapaz, o queria para si e no reflexo de narciso mostrou seu rosto ao qual o jovem foi ao encontro.

terça-feira, 21 de maio de 2013

- Amor.

Sem pestanejar respondeu o garoto ao ser indagado sobre qual o preço dele pra ser levado pra cama.
Caro demais - preferiu procurar outro homem.

domingo, 14 de abril de 2013

me pergunto: o que me leva a manter espaço ainda, a escrever aqui. não sei responder. tento, mas dou voltas e me engano, finjo que ainda há um motivo para escrever, alguém a quem possa me endereçar. algum olhar perdido. são 4 horas da manhã, madrugada de sábado para domingo, enquanto as pessoas estão nas ruas, bebendo, procurando, trocando mais que beijos... eu, aqui, sentado diante do computador, minhas costas doem, a caneca de café vazia ao lado, o quarto envolvendo o próprio caos de minhas ideias. não tenho mais chocolate. mas ainda tenho fome. mas nem sei do quê.  a aventura da noite, tentando passear pela turquia com pierre loti. a tradução está em andamento. mas estou disperso, não sei o que pensar. já não tenho mais grandes crenças. estou definitivamente cansado e mal comecei esta vida. ainda não sou chancela de nada, minha opinião não vale um nada.  mas estou tentando, galgando os degraus. eu recapitulo os meus planos gradiosos e vejo que até agora nenhum deles se manteve por perto. nenhum deles irá acontecer, bem sei. meu tornozelo esquerdo dói da aula de ballet na sexta, a pressão de subir nas pontas ainda marca ele. quanto ao resto, já não sei mais. um convite para habitar um coração, talvez? mas não há coração, afora aqueles devorados na mesa de jantar. a possibilidade irônica está agora longe, como um remake ruim de lago dos cisnes, não é odile a vilã, mas a pureza de odette que é insuportável.  precisava de uma massagem, mas me satisfaria um abraço apertado. a cada dia mais só, a cada dia, mas há sempre os livros, aos milhares. é engraçado, já que o livro é como uma grande prostituta que se abre a quem nele  chegar para procurar o que for, ele se abre e acolhe entre as páginas, como se fossem coxas, e permite o que não se deveria. e nos perdemos nas vírgulas como quem é roubado numa esquina. talvez eu precise de mais café. ou simplesmente da coragem para levantar desta cama e sair caminhar pela madrugada e ver o sol nascer em algum lugar diante do mar. mas não, não quero sair deste conforto intrigante, há o frio, há o escuro. aqui há apenas o caractere pesado e negro manchando a tela onde todas as minhas lutas são com um dragão de papel. não sei que me resta.

domingo, 7 de abril de 2013

fecho meus olhos e repasso as alternativas. o quarto de janelas fechadas, a luz acesa, os livros espalhados pelo chão, as coisas de dança lançadas a um canto... o celular em silêncio. houve uma época em que as coisas, cada qual, já se encontrou em seu lugar e que havia espaço para o ar circular e os pés tocarem o chão. agora apenas ouço nicole croisille e me resta o silêncio aterrador. o que posso querer ainda? há uma ousadia tão grande em pensar nisto. estou me tornando invisível, estou perdendo minhas palavras. já não consigo escrever, talvez por isso hoje em dia é sempre uma página a menos, uma linha a menos... já não consigo também desenhar com a mesma facilidade antes. me sinto vazio como se apenas insistisse em existir, mas sem motivo, mas também sem forças ou razões pra encontrar algum motivo.  eu repito há tanto tempo a mesma história, o mesmo fuso horário, o galope dos dias. talvez seja o momento para voltar a visitar grandes ruínas, o silêncio estarrecedor do resto no meio do caos. mas não há possibilidade para o caos, há a impertinência de uma organização sem fim e, no entanto, não tenho mais reflexo ao espelho. não saberia dizer há quanto tempo não desenho mais meu rosto. houve um dia, um banho, um rosto lavado, em que a maquiagem escorreu ralo abaixo e eu não me encontrei nisto que ficava nem mesmo nas cores que se íam com a água. talvez eu tenha me perdido no caminho, na volta pra casa, ao dobrar uma esquina. queria um gole quente de café, meu chocolate acabou...  a vida transformou-se numa sequência de páginas a serem lidas e num outro tanto de páginas para ser escritas. e eu canso, tropeço... falho até até as raias da ortografia, quando as letras começam a ser trocadas, quando as pálpebras pesam... e então eu imagino ser a hora de parar, de fechar os olhos, tentar sonhar, mas nunca sonho, ou não há um sonho novo ou ele é apenas esquecido junto com o corpo que perde seu nome na cama. e resta a escuridão. e todos meus fantasmas amigos são aqueles que sofrem... é emma, clarisse, ofélia... mas toda pontinha de solidão é como as madeleines de proust, fazem pensar.... abrem o mundo. mas há quem prefira romances policiais. aquele desvendar do seu segredo ao piscar de olhos, um desvio na retina, um sorriso que não se vê, ideias insubordinadas abafadas por lenços de seda. e há quem vai a praia e veja o sol se pôr. mas eu continuo aqui, livro aberto, no aperto... tentando pensar.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

sentado diante da tv, choro. mas não há nada de novo na tela ou diante dela. o sofá vermelho me expulsando devagar, os livros sobre a mesa já abertos à espera. eu também espero. queria não pedir, não implorar a migalha de atenção, mas aos poucos eu vou desistindo de mim. não é que o castelo de cartas desmorone, nunca houve castelo. talvez um dia toque a campainha e seja o correio. talvez um dia toque o telefone e seja você. te enviei um convite para um café, para embebedar seus dentes alvos num pouco de cafeína, o único modo que tenho de não lhe tocando (porque me é vedado) de lhe alterar o pulso. mas eu não sou a chuva com seus relâmpagos e trovões que te empurra para baixo do edredon, cada vez mais perto de mim. eu preciso preterir o pretérito. aqui, chovendo em mim, invento a ficção para fazer as coisas funcionarem: coloco hegel no divã de lacan. e tento me ocupar. não queria sentir sua falta ausente, você que nunca esteve aqui, nunca tocou nas minhas páginas. queria trocar chocolates por beijos. ou não trocaria nada e apenas teria os teus beijos. eu tenho fome, mas não consigo sair daqui. não consigo pensar nem no livro, tropeço na tua imagem. nesta imagem silenciosa que eu queria mas não posso... não devo. eu me sinto feio, estranho... não tenho nada a te oferecer a não ser a possibilidade de se perder comigo pelos corredores escuros da biblioteca, mas que você apenas me oferece nos meus sonhos. não tenho aqui, não estou nos teus sonhos, não te acompanho enquanto dormes. eu não tenho minha taça de vinho, nenhuma sequer,mas tenho o campo aberto até a linha do horizonte. talvez se eu corresse tanto, tanto e tanto, para além da última gota de suor, para além do ponto em que as pernas aguentassem, para além de qualquer expectativa, eu chegasse em algum lugar e lá te encontrasse. mas isso é apenas um desejo poético. eu sei onde estas, sei as ruas por onde andas e por onde segues. sei o peso de tuas letras. enquanto eu fico aqui contando até três, lavando o rosto, tentando e tentando, com força e ainda, e tu me engoles neste silêncio. talvez seja o peso do tempo que nos separa e não o espaço. como a madeleine de proust: estou lugar certo, mas no tempo errado. não sei se devo andar para frente ou para trás. como virar a ampulheta, sem mudar nada. cruzando os espaços, trocando os livros, escondendo o nome. e esta noite você viria a minha casa, escutaríamos john bennet, tomaríamos um scotch, que sei que tu não bebes, mas aprenderia. eu sei o que quero, que é nesta suspensão de corda bamba, sem exigências. o mine eyes... meu príncipe... é tua voz assolando meus corredores, tua respiração... mas meu príncipe talvez nem exista com sua nobreza de pés descalços e dorso nu... saltando na água ao fim da tarde, deixando-se beijar pelo quente toque de bronze do sol. e aos poucos até estas lágrimas perdem o sentido, estas palavras vão se apagando, o corpo amaciado abraça a tela, tenta se esquece de novo e ainda e mais uma. talvez tentando digerir o teu nome que ainda não sabe, esperando que os dados parem de girar ou que a bala, roleta russa, enfim atinja algum corpo. você logo vai descobrir que eu não sou a fantasia de ninguém. e eu não permito que você desconfie do real destas lágrimas, do gosto amargo da boca vazia, das borboletas digeridas pelo suco gástrico. eu tenho os postais que quero te enviar já escritos, as cartas, os planos no qual você é apenas um espaço a ser preenchido por um tempo que não vem. isto não quer dizer que eu creia em destino, mas que sonho e te faço delírio. te encontro nas linhas da minha mão porque, em vão, tento te segurar aqui. não sou eu que coloco o ponto final desta história que é impossível de ser contada, mas porque em nenhum mundo possível houve lógica que a suportasse ou uma linguagem em que se pudesse registrá-la. mas eu tento. é preciso tentar. arriscar puxar o gatilho do 38 ou o salto de um vigésimo andar, deixando o corpo em queda-livre. sem correntes. meu rosto ainda coça, estou sem maquiagem... vou ao banho, talvez um pouco de mim desça ralo abaixo, esquecendo a superfície da pele, limpando os pensamento. ou talvez, como sempre, depois do banho, na impossibilidade de me esquecer, eu abra um livro e durma sobre ele e num sono sem sonhos, mais uma vez eu não te encontre.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Notas suplementares sobre Dragon Ball


(Para Michele Martins de Oliveira)

É preciso entender, antes de realizar uma leitura sociológica, qual a aparência formal que esta narrativa, dado que a forma do desenho-seriado nada mais é que um modo de contar um relato, assume. É uma aventura, certamente, mas o modelo padrão escapa ao modo épico, mas se sujeita ao elemento trágico, conformado, sobretudo na padronização de uma “herança trágica”, que pode ser traduzida num elemento proustiano, como em La Recherche: nos pontos em que a narrativa é uma narrativa de gerações (no caso trágico, por exemplo, se pode situar isto na passagem do Édipo para Antígona): tem-se Goku, depois Gohan, depois Goten (ainda que no mesmo grau de parentesco que Gohan), Pan (neta de Goku) e Goku Jr. (bisneto de Goku e filho de Pan que aparece no último episódio de Dragon Ball GT).
O elemento grego aqui é salientado por outro ponto de vista, que aqui interessaria ao relato. Se rejeito a questão do épico, é justamente por deixar de lado a conformação de um ethos, enquanto o ideal de uma comunidade, para salientar o fundamento da  pólis. Há que se observar que a mesma dimensão dúplice entre homens e deuses é retraduzida na animação: uma instituição como a dos Senhores Kaio [Kaioshins], bem como Kami Sama, que são personagens (“quase-que”) imortais que decidem e estão acima dos humanos, como grandes gerentes (ou reguladores) da instituição cósmica, seja dos sistemas planetários, seja do planeta Terra, seja ainda da vida após a morte (como é o caso do Sr. Enmadaio), cujo papel é, de certa forma, uma garantia funcional.
A hipótese trágica ainda se sustenta na manutenção do mote que dá origem a animação: a satisfação do desejo. Bulma é impelida, por seu desejo por um “namorado perfeito”, na busca das esferas do dragão e  no processo conhece Goku (que possui uma das esferas). Os vilões, que de início também partilham esta busca (sendo o desejo de imortalidade uma possível tradução do conceito se soberania). De outro lado ainda, o destino geral da comunidade é posto nas mãos de um estrageiro: se Édipo, como soberano de Tebas, é um estrangeiro, não obstante seu drama é que é um filho de Tebas, temos que Goku, é estrangeiro (um sayajin), mas não obstante seu ponto de pertença é terráqueo (o que instaura o paradoxo, por exemplo, dele ter sido enviado para destruir a terra e acabar por defendê-la – na inversão de significações a partir de um significante-mestre que acabar por dar novas significações ao que anteriormente exposto, procedimento recorrente na tragédia). Porém, o drama apesar de sua aparência trágica se  resolve de uma maneira pouco grega: tudo sempre acaba bem. Solução pequeno-burguesa e idealizada em que após uma serie de eventos catastróficos a paz, ainda que por um curto período, pode ser desfrutada.
Duas perguntas então podem ser situadas nas passagens da gerações, tal como apreendidas em DB, DBZ e DBGT: se o tempo passa, (1) como o espaço configurado pela animação situa suas próprias mudanças;  e,(2) quais as mudanças estruturais e sociais travadas e encenadas na representação destas cidades?
 Da cidade rústica com dinossauros à Cosmopólis de Trunks (“o do futuro”), quais os entrechoques de representação aí? É claramente evidenciada que toda transformação histórica pressupõe uma transformação no espaço, embora no espaço híbrido de Dragon ball, tais transformações são sobretudo de uma sobredeterminação sócio-cultural. Explico: cidades ultratecnológicas, como a de Bulma, coexistem ao lado de vilas pré-históricas (o que serve como alegoria para condição do nosso mundo contemporâneo, já que há locais bem-desenvolvidos e outros que ainda, por razões culturais, mantém-se com uma tecnologia “artesanal”), fazendo com a  linearidade cronológica possa ser cindir em tempos que possuem suas próprias variáveis: tecnologia, organização humana (violência/barbárie), sociabilidade. Não apenas as cidades e comunidades que são representadas ao longo da animação variam, como os próprios planetas visitados oferecem "complexos culturais" que favorecem a polissemia que a vida (tomada entre experiência [Erfahrung] e vivência [Erlebnis])  assume (desde a-história, como o ponto observador, da morada dos Kaios e de Kami-Sama, ao momento pós-histórico do julgamento das almas por Enmadaio, que podem ser enviadas a vida, isto é, novamente à história por  Shenlong – ver o caso de Kuririn).
Na esfera da vivência, saturada de eventos e sensações, resta ao seres em questão, os habitantes destas cidades (terráqueos, saiajins, namekuseijins, etc), a capacidade de reagir a estes estímulos, bem como aos intrusos – sempre alteridades radicais e por isso vilões dentro da narrativa). Numa abordagem freudiana: toda chegada de um vilão é traumática, já que a imposição de seu desejo ultrapassa a demanda destes “pequenos outros” que tentam, então, resistir a sua vontade imperiosa. O interessante também aqui é como o conceito de humano é relativizado: já que terráqueo ou namekuseijin marcam os planetas de origem, no caso a Terra ou Namekusei, a enfática a raça aparece no caso dos sayajins cuja origem está no planeta Vegeta. Há, portanto, a retomada de um tema  biopolítico dentro de um tema darwinista: qual é a raça superior capaz de colonizar (leia-se “imperar”) no universo? – O que instaura um debate étnico , que é uma das variáveis da animação no âmbito de sua representação, já que as raças em questão se organizam em estruturas políticas,  econômicas e sociais que configuram tanto a estética (arquitetura) de seus espaço, quando sua geografia. Assim é que dos planetas rurais (Namekusei) aos planetas marciais de regime espartano (Vegeta), o degradé civilizatório se arma: há mundos em ruínas (como Alpha, na Galáxia Sul, arrasado e inabitado), desérticos (como Arlia, mas que possuem vida inteligente), hiper-tecnocratas (como o planeta-máquina Big Ghetti Star) etc.
No caso das cidades de DBZ, sua memória pouco marca destes traumas, não há registros urbanos do que aconteceu, isto se supervalorizarmos a dimensão da história sobre a geografia, isto é, o dado diacrônico. No dado sincrônico, em que o espaço pode ser mapeado (assim, a geografia suplanta a história, já que em termos o que se tem é sempre a enfática de um presente, mesmo quando Mirai Trunks viaja do futuro, por exemplo). Um dado interessante por exemplo, é que o único momento em aparece um narrador para a história em Dragon Ball é na abertura do desenho em que este assume a voz que vai assinalar em que ponto da aventura (episódio) se esta, dando um título para o “capítulo” em questão.
Há elementos que são reiterados ao longo de toda animação, que fundam a circulação dos personagens: como a ilha de Mestre Kame, o deserto Yamcha, a montanha Frypan, a ilha Papaya (onde se realiza o torneio de artes marciais intitulado Tenkaichi Budokai), a Capital do Oeste (cidade de Bulma onde fica localizada a  Corporação Cápsula, uma espécie de monopólio no mercado mundial similar a Umbrella Corporation de Resident Evil, embora os limites destas avancem no terreno dos produtos farmacêuticos, armamentos, computadores e outras atividades clandestinas de pesquisa biológica, aquela produz também elementos técnicos variados, mas é enquadrada ao estilo de um "bom modelo"), etc. Outro dado relevante é a estruturação cardeal num eco claramente cristão, já que reflete a estrutura celestial ( Sr. Kaio do Norte, do Sul, do Leste e do Oeste) que se expressa nas capitais, também do Leste, Oeste, Sul, Norte e Central.
Bom, o enfoque claro do desenho são nestes heróis, marcados por uma personalidade exploradora, em sentido amplo, e aventureira. São pessoas fora da ordem social pré-estabelecida ou mesmo, para nos expressarmos em jargão marxista, fora da luta de classes. Por outro lado, expressão de um modo muito singular a dialética do senhor e do escravo, com enfoque na luta originária (dois homens lutam por reconhecimento). De profissões efetivas (liberais), pouco se retrata, a não ser no mercado anônimo ou como pano-de-fundo do desenho, como algo que dá suporte a manutenção da vida (os restaurantes, mercados populares, escolas, etc). A profissão-chave é a de lutador e guerreiro (a maior parte dos personagens com nome se enquadra aqui), o que enfatiza o caráter militar da animação, há ainda os doutores (embora não se saiba exatamente em quê) e cientistas (como Myuu, o “mau” Dr. Maki Gero e o “bom”  Dr. Brief), feiticeiros, mágico e magos (Bibidi, Hoi e Uranai Baba), monges (Kuririn e Yajirobe), professores (a maior parte dos “conhecidos” são professores de artes marciais, como Sr. Satan e Mestre Kame), mas há também personagens paralelos como Mestre Karin, cuja função não é muito clara, mas sabe-se que  é quem cultiva as sementes dos deuses [senzu beans], Mez  que é um ogro que cuida e ajuda a administrar o inferno, Nappa que é um guerreiro, mas também é o guarda-espadas de Vegeta que por sinal é um príncipe, como Ox King é rei (rei Cutelo), Pui Pui que é guarda-costas de Badidi,  como há há fazendeiros, andróides, robôs, mercenários, ladrões (Yamcha, por exemplo é um ladrão do deserto). Em meio a isto, seguem-se personagens menores que também mereceriam uma leitura mais pontual, como é o caso do câmera man que registra o torneio de Cell e o repórter sem nome que o acompanha, os comentaristas Bodoukai, Lunch que é cozinheira, mas como leitura de oposição há ainda as donas de casa Sra. Brief (burguesa) e Chi Chi (que embora seja filha do rei Cutelo e, portanto, uma princesa, age por vezes como uma dona de casa de classe média) e, por fim, o Sr. Popo, que é negro com turbante indiano, que é o ajudante de Kami Sama da Terra.

De resto, a pergunta que fica é: como a nossa cultura (se compreendermos cultura como um  Todo que abarca desde as expressões artísticas, as instituições humanas, a trama discursiva –isto é, história, economia, política, etc - a conceitos abstratos tais como liberdade, igualdade, etc) é representada? Como os sistemas alegóricos e dispares da ficção proporcionam uma leitura de nossa realidade,  revisitando seus problemas e tensões? Como dar potência crítica a animação através do nosso contraponto cotidiano? Como as relações, para além do projeto visual, demonstram estes seres relacionando-se com seu espaço e uns com outros, como isto pode (e deve) ser lido alegórica, metafórica ou metonimicamente como um reflexo da cultura (e qual noção cultural específica, já que na dimensão singular do desenho, nasce na cultura japonesa, como mangá shounen, lançado no Brasil pela editora Abril  e veiculado pela rede Globo, em 2001) - questões levantadas   nas abordagens de Sônia Luyten.
________________
Nota:
Este texto segue dedicado a  Michele justamente por responder a um pedido de comentário ao seu Trabalho de Conclusão do Curso de Geografia. Não tendo tido acesso ao trabalho final, mas apenas a fragmento dele, tencionei desenhar aqui um modo de operar uma leitura em suas diretrizes mais genéricas, apontando possibilidades e caminhos, apesar de não realizar, em absoluto, nenhuma espécie de hipótese teórica.  

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

(para o príncipe)

aquele momento em que se para se abre o livro, por onde começar a ler, o primeiro parágrafo, a primeira palavra, a primeira vírgula. o pensamento distorcido, a demanda de pensar mesmo quando o pensamento não quer, quando não se consegue, quando não se pode. e penso em você,  andromaque, estrela equidistante e reluzente que me captura o olhar. tu, que como viajante descuidado, navegando em águas perigosas e turvas, nestas águas impalpáveis que escrevo como no fundo de um espelho, tu, é em ti que penso. e viro as páginas. tu me dizes, eu tenho medo.  ("sorrisos", você escreveria). tu, pequeno, diante da escola, eu não te esqueceria, pegaria sua mão, o sorriso as covinhas... na mão um sorvete de pistache. enquanto o ônibus não vem. eu aqui, olhando o mar. você daí, também olhando o mar, como se um oceano nos separasse. eu me perco de novo nas referências e peço desculpas. (apaixonado por sorrisos e um bom amante de abraços). eu te escrevi minha pequena carta, numa letra torta, tu rirás, tu saberás rir quando retomar as garatujas de novo, decifrando mais de mim que a própria caligrafia permitiria. eu te sequestraria, na impossibilidade de me amares, esperando e cultivando a tua síndrome de estocolmo. final de noite, ocultos pela penumbra, fugindo até a padaria da esquina para comer coxinha. nossa trilha sonora desliza entre meu chico e minha bethânia, e sua tiê, roberta sá, daniel chaudon, dani black, jeneci... seu repertório é mais amplo, mas nos violinos antiquados, talvez o meu seja mais seguro. e ouvimos repetidas vezes, como se ouvir pudesse preencher esta distância, fazendo a exaustão aparecer ali onde os corpos não conseguem mais se tocar, não porque não se queira, mas porque esta distância tomada por espaço, preenchida pelo desejo, cartograficamente quilometrada impede. duas sombras pedalando à beira-mar. mas eu nem gosto de bicicleta. (me desenha um carneirinho?).  eu te prendi nos corredores e nas esquinas dos meus sonhos. (me dá mais um beijo?). e dividimos os corredores da biblioteca... um bom beijo é aquele de quando os livros caem, páginas e páginas, e nos sentimos vistos, jane austen, virginia, joyce, que importa? e te peço desculpas por te encher de mim quando te prometi apenas doses homeopáticas... e te segurei, nos ponteiros, pelas pontas da imagem, com peito desnudo... meu cisne não escapará da gaiola, ele não está preso. eu te fiz perder a hora, não te quero fazer perder teu tempo... este tempo que também escapa ao relógio, me dá cá meu abraço, meu príncipe que precisa de mais do que um beijo para acordar, volta pra cama... vem dormir comigo no calor da manhã?